Travis Scott não é apenas um músico talentoso com uma energia louca, que às vezes se espalha em situações desagradáveis (lembre-se das notícias de hoje sobre a briga em Paris), mas uma marca bem formada com poder de marketing não inferior ao do logotipo da Supreme. Vamos analisar os principais marcos da carreira do músico e perceber o que faz dele um verdadeiro gênio.
JOVENS NO TEXAS E O PRIMEIRO SUCESSO
Tudo começou quando um garoto de Houston, Jacque Berman Webster (o nome verdadeiro do rapper), prometeu à sua namorada que um dia trabalharia com Jay-Z. Scott nasceu em 1992 em uma família criativa – seu pai deixou a carreira de baterista para trabalhar, seu tio tocava guitarra e seu avô insistiu com todas as forças para que ele tivesse uma educação musical, pois percebeu o interesse do neto pela arte. E ele realmente tentou: Travis entrou na Universidade do Texas em San Antonio e estudou lá por dois anos. Depois, decidiu pegar todo o dinheiro alocado para seus estudos e partiu para Nova York (o que deixou sua mãe ressentida por muito tempo). No início, ele dormia nos carros de conhecidos do Texas e, durante todo o dia, enviava músicas para produtores e artistas famosos por correio eletrônico e redes sociais. A paixão fanática do rapaz pela música ocupava todo o seu tempo livre, ele sabia que alcançaria o sucesso e, por ele, estava pronto para tudo.
O resultado não demorou a chegar e, naquela época, o jovem produtor começou a trabalhar no estúdio GOOD Music, onde Kanye West e Jay-Z estavam gravando. Já no início, ele conseguiu cumprir a promessa feita à sua namorada do ensino médio. Mas Scott não queria continuar sendo apenas um beatmaker, então começou a desenvolver uma carreira solo, gravar muito material e se apresentar em pequenos clubes. Em 2015, o rapper lançou seu álbum de estreia, “Rodeo”, que foi precedido por duas mixtapes, “Owl Pharaoh” e “Days Before Rodeo”, com energia desenfreada, sem nenhuma conexão conceitual. Antes do disco, Jacques era conhecido como ajudante de Kanye West (ele participou da produção de “New Slaves”, de “Yeezus”). Mas agora o ouvinte se depara com um artista completo, o mesmo sonhador de Houston que quer virar o setor musical de cabeça para baixo. Embora muitas vezes os fãs fiéis possam perceber referências ao trabalho dos mentores de Scott – às vezes a Yeezus, às vezes a Kid Cudi. Na época, “Rodeo” foi recebido com frieza pelo público, mas os comentários contemporâneos sobre Genius provam que, como um bom vinho, ele só melhora com o passar dos anos.
APRESENTAÇÕES E RECONHECIMENTO DO SETOR
Desde seu álbum de estreia, Scott tem trabalhado duro, fazendo conexões com o setor e gravando vários discos de sucesso: “Days Before Birds”, “Birds in the Trap Sing McKnight” com o sucesso “Goosebumps” com Kendrick Lamar, “Beibs in the Trap” com NAV, “Through the Late Night” com Kid Cudi, “Pick Up the Phone” com Young Thug e “The Ends” com André 3000. Além de ter participado do lançamento de um dos produtores de som mais bem-sucedidos de Metro Boomin, “Not All Heroes Wear Capes”, que contou com a participação de praticamente todas as estrelas do hip-hop: Gucci Mane, 21 Savage, Swae Lee, Gunna, Young Thug, Drake e Offset. Agora Travis é realmente um artista completo, cujo som e estilo foram apreciados por críticos profissionais e fãs.
PARQUE DE DIVERSÕES MÁGICO E “ASTROWORLD”
No entanto, a verdadeira coroação da criatividade, que ainda reúne milhões de ouvintes, é o álbum “Astroworld”, que nasceu em 2018 (o disco ficou no topo da parada da Billboard, ganhou duas indicações ao Grammy e status de platina). O título do lançamento é inspirado no parque de diversões de mesmo nome, que deixou de funcionar em 2005. Scott foi ao local quando era muito jovem e ficou com saudades depois que ele fechou.
Depois de um tempo, o músico começa a visualizar seus videoclipes mais populares – a estética do parque de diversões mágico é transferida para o vídeo. Os vídeos de Travis apresentam muitos gráficos 3D e técnicas de edição usadas com maestria. Isso é mais perceptível nos vídeos das faixas “Sicko Mode” e “Can’t Say”. No vídeo de “Yosemite”, o artista vai ainda mais longe e se transforma em uma criança pequena que vai para uma ilha tropical onde fica o parque de diversões. E o vídeo da faixa “Wake Up” começa completamente diferente do estilo de Scott: ele vagueia por uma mansão e passa por pessoas que estão tentando acordar depois de uma festa barulhenta (dessa vez sem decorações selvagens e viagem de ácido). Mas, em seguida, o rapper retorna às técnicas visuais usuais e à computação gráfica (Jonah Hill foi o diretor). Travis constrói um mundo cyberpunk futurista especial, no qual o passado fica em segundo plano. E, de acordo com as leis do gênero, esse universo é dominado por um herói – o mais legal entre os sobreviventes. E esse é o Scott.
Após o lançamento, Travis trouxe a alegria de volta à sua cidade natal, Houston, lançando um festival de música com o mesmo nome que transportou os ouvintes para uma atmosfera de diversão e celebração. O evento contou com brinquedos, artistas de circo, algodão doce e pipoca. O álbum e o festival se tornaram verdadeiros sucessos, mas, ao mesmo tempo, o músico enfrentou uma responsabilidade real pela primeira vez. Houve uma tragédia no evento que tirou a vida de dez pessoas (muitas delas ainda eram adolescentes). Os fãs começaram a desmaiar devido à multidão insana: estima-se que havia cerca de cinco ou seis pessoas em um metro quadrado, o que causou problemas respiratórios. Scott não interrompeu o show, mas há relatos de que ele só ficou sabendo do incidente após a apresentação. Após a tragédia, a reputação de Travis foi arruinada. Tudo foi atacado: parcerias com marcas, sua carreira musical e o legado espiritual que o rapper vinha acumulando há anos. Ele teve que fechar o Astroworld, assim como uma vez teve que vivenciar o colapso de um parque de verdade. O tribunal absolveu totalmente o músico apenas dois anos após os eventos em Houston.
ESTILO E COLABORAÇÕES
Travis transforma um movimento de fãs comum em um culto à personalidade: é um clube aberto do qual todos podem fazer parte – desde crianças em idade escolar que compram skins em jogos e pulam em um show até homens de negócios que não poupam alguns milhares de dólares para comprar tênis em colaboração com a Dior. Quando se fala sobre a marca pessoal de Scott, é inevitável que, em um momento ou outro, a pessoa seja confrontada com o capitalismo e a cultura do consumo. O músico não cria um novo produto, ele inscreve seu nome nos produtos de marcas já existentes com uma longa história, complementando-os com motivos característicos. A história de Jacques Berman Webster é uma história de enorme sucesso na mídia que, muitas vezes, é melhor monetizada do que a de outros artistas.
Em 2017, Scott colabora pela primeira vez com uma marca com um nome realmente grande: ele se torna designer convidado da Helmut Lang e lança uma coleção cápsula. Referências aos seus álbuns “Birds Sing McKnight in the Trap” e “Rodeo”, bem como à sua cidade natal, Houston, aparecem nas roupas: isso pode ser visto na paleta terrosa, que fala sobre as paisagens do Texas, e no simbolismo – búfalos, chapéus e cowboys.
Então, inspirado pelo sucesso comercial da linha de tênis Yeezy de Kanye, Travis cria a sua própria, mas em colaboração com a Nike. O custo dos modelos mais raros na revenda é de vários milhares de dólares. Um ótimo exemplo é o modelo Jordan 1, que foi vendido por cerca de US$ 1.500, ou seja, 748% mais caro do que o preço original. Ao adquiri-los, os fãs abraçam o legado do artista e sentem uma conexão especial com ele. Após o sucesso comercial, a marca e o músico continuaram a trabalhar juntos e já lançaram mais de dez modelos diferentes, que se esgotam nos primeiros minutos após o lançamento.
Depois de sua colaboração com a Nike, o nome de Travis Scott ficou conhecido nos círculos de moda mais luxuosos. Então, o diretor criativo da Saint Laurent, Anthony Vaccarello, se interessou por ele: o designer convidou o rapper para estrelar uma campanha publicitária para a coleção primavera-verão 2019, inspirada em Nova York nos anos 70. O autor das fotos foi David Sims. Também como parte da colaboração, o músico lança um disco de vinil com uma estampa de edição limitada. Dessa forma, a marca estendeu sua influência a um novo público, e o nome de Travis foi ouvido entre um público mais elitizado.
A genialidade de Scott está em seu aguçado senso de oportunidade e nas necessidades de seus fãs. Em 2020, quando a pandemia do coronavírus assolava o mundo e os shows estavam fora de cogitação, ele decidiu se apresentar no universo dos jogos, ou seja, no Fortnite. O evento foi histórico. No dia seguinte, a Epic Games anunciou que a plataforma conseguiu quebrar o recorde on-line (mais de 12 milhões de pessoas assistiram à apresentação ao mesmo tempo). Mas mesmo aqui o espírito empreendedor de Scott se fez sentir: após o show, os jogadores tiveram a oportunidade de comprar roupas virtuais para o jogo, inspiradas no estilo do artista. O trabalho de Scott foi ouvido por milhões de fãs em todo o mundo, mesmo nos lugares mais remotos, onde seria improvável a realização de um show.
Scott então se perguntou o que as pessoas gostam ainda mais do que jogos. A resposta a essa pergunta foi uma colaboração com o McDonald’s. A rede de restaurantes e o rapper apresentaram um cardápio que custava apenas seis dólares. Travis não parou por aí e lançou uma coleção de produtos: bandejas, caixas de comida, marcadores de lugar, toalhas e travesseiros. Os fãs também tiveram a oportunidade de comprar uma réplica de papelão em tamanho real do músico. Essa é a primeira colaboração do McDonald’s com uma celebridade desde 1992, quando eles colaboraram com Michael Jordan.
Foi planejado que o rapper apresentaria o álbum tendo como pano de fundo as pirâmides egípcias: as coordenadas 29.9792, 31.1342 estavam escritas no anúncio do show. Esse é o local onde está localizada a pirâmide de Quéops (parece difícil imaginar um lugar mais utópico para uma apresentação). No entanto, o show teve que ser cancelado: o músico enfrentou a incompreensão do governo local. O Ministério da Cultura declarou que “não permitirá ações que vão contra os valores da nação”. A apresentação do álbum foi realizada, mas em outro local histórico. Scott foi a Roma – o show foi realizado no hipódromo mais antigo do mundo. Kanye West, amigo de longa data do músico, apareceu no palco e juntos eles tocaram as faixas “Praise God”, do álbum “Donda”, de Ye, e “Can’t Tell Me Nothing”. Travis apoiou o amigo nos momentos difíceis, quando quase todo o mundo lhe deu as costas por causa de suas declarações. Ele lhe deu crédito: Kanye sempre esteve ao lado de Scott durante eventos trágicos para Scott também.
Algum tempo depois, o músico lançou o filme “Circus Maximus” para coincidir com o lançamento do álbum. É uma jornada de 1 hora e 15 minutos, que faz você mergulhar no mundo do disco. Nele, Scott caminha por belas paisagens e, em seu caminho, encontra monstros e Rick Rubin, que faz o papel de Yoda local. Na segunda parte do filme, o rapper faz um show em um local semelhante ao Coliseu. Gaspar Noé, Harmony Korine, Nicolas Winding Refn, Valdimar Johannsson e Kahlil Joseph participaram do trabalho no filme.
Scott é um dos artistas de hip-hop mais influentes e talentosos da atualidade. Seu som único, suas ideias inovadoras e seu desempenho enérgico conquistaram o coração de milhões de fãs em todo o mundo. Entretanto, Travis não é apenas um músico, mas também um produtor e empresário talentoso. Ele não tem medo de experimentar e encontrar novas maneiras de se expressar – por meio da música, da moda, do comércio e da arte. O músico está ansioso pelo futuro e confiante nele.
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